TYRANT, A HISTÓRIA DE DINOSSAUROS DO STEVE BISSETTE
Um pouco de história:
No período áureo dos títulos independentes na década de 90, a variedade da oferta era tal que até apostas mais arriscadas, em títulos experimentais, apareciam. Tyrant, de Steve Bissette, o desenhista que tinha se consagrado no lápis do Monstro do Pântano, era uma dessas apostas.
Tyrant era um projeto para “durar 10 anos”, em edições bimensais, contando a história, do nascimento à morte, de um tiranossauro. Autopublicada pela SpiderBaby, por onde já saía a revista de terror Taboo, Tyrant tinha a bravura típica da época: em preto e branco (um nicho que sempre afastava o grande público, portanto eliminando a chance de grandes vendagens), era um projeto para longuíssimo prazo (o que aumentava o risco, em que pese Cerebus e Bone conseguirem) num assunto não necessariamente atraente: quem quer ler sobre a vida de um dinossauro, narrada de forma realista, tanto quanto possível respeitando o conhecimento científico?

Bissete apostou todas as fichas:
Steve Bissette pôs todas as fichas na ideia. Nunca seu preto e branco foi tão expressivo, uma aula de composição e hachuras em cada página. Tirou da cartola um roteiro cheio de truques, abrindo espaço para encaixar edições isoladas e pistas sutis que seriam retomadas no futuro, como Neil Gaiman demonstrou que era possível em Sandman. Enfiou a cara nos livros de paleontologia, ao ponto de reservar uma página por edição para notas bibliográficas.
O resultado impressiona. Bissette comanda a narrativa, alternando cenas de muita ação com processos quase estáticos: a terceira edição é toda dedicada à lenta gestação dentro de um ovo do feto de um tiranossauro. Uma pequena obra-prima no modo como os elementos da gramática dos quadrinhos são usados para retratar um processo da natureza. Como Larry Marder tinha conseguido com Beanworld, só que de forma realista.

Infelizmente, houve o Crack dos quadrinhos:
Fica no reino da imaginação os limites que Tyrant poderia ter alcançado; a revista foi só até o quarto número, abatida por atrasos na produção (Steve Bissette decidiu refazer toda a primeira parte do número 3, após receber informações mais detalhadas sobre a gestação), crash do mercado de quadrinhos, e problemas pessoais (um fim de casamento). Talvez tivesse saído dali outro From Hell, outro Cages, mas Tyrant tenha ficado mais para Big Numbers.
As três primeiras edições chegaram a ser colecionadas num volume encadernado, e foi isso. Tyrant é uma das joias perdidas que por si só justifica escrever essa série.